10. RESISTÊNCIA DA FAMÍLIA

10. RESISTÊNCIA DA FAMÍLIA
Entretanto, a notícia do acontecimento tinha-se espalhado.
Minha mãe começava a afligir-se e queria, a todo o custo, que eu
me desdissesse. Um dia, antes que saísse com o rebanho, quis
obrigar-me a confessar que tinha mentido. Não poupou, para isso,
carinhos, ameaças, nem mesmo o cabo da vassoura. Não conseguindo obter outra resposta que um mudo silêncio ou a
confirmação do que já tinha dito, mandou-me abrir o rebanho,
dizendo que pensasse bem, durante o dia; que, se nunca tinha
consentido uma mentira nos seus filhos, muito menos consentia
agora uma daquela espécie; que, à noite, me obrigaria a ir junto
daquelas pessoas a quem tinha enganado, confessar que tinha
mentido e pedir perdão.
Lá fui com as minhas ovelhinhas; e nesse dia já os meus
companheiros me esperavam. Ao verem-me a chorar, correram a
perguntar-me a causa. Contei-lhes o que se tinha passado e
acrescentei:
– Agora, digam-me como vou fazer?! Minha mãe quer, a todo
o custo, que diga que menti; e como vou a dizê-lo?
Então o Francisco diz para a Jacinta:
– Vês? Tu é que tens a culpa! Para que o foste a dizer?
A pobre criança, chorando, põe-se de joelhos, com as mãos
postas, a pedir-nos perdão:
– Fiz mal – dizia, chorando – mas eu nunca mais digo nada a
ninguém!
Agora, perguntará V. Ex.cia: Quem Ihe ensinou a fazer esse
acto de humildade?!
– Não sei. Talvez por ver seus irmãozinhos pedir perdão a
seus pais, na véspera de comungar; ou porque a Jacinta foi, segundo me parece, aquela a quem a Santíssima Virgem comunicou
maior abundância de graça, conhecimento de Deus e da virtude.
Quando, algum tempo depois, o Senhor Prior (12) nos mandou chamar, para nos interrogar, a Jacinta baixou a cabeça e a
custo sua Rev.cia conseguiu obter dela apenas duas ou três palavras. Quando viemos embora, perguntei-lhe:
– Por que não querias responder ao Senhor Prior?
– Porque prometi não dizer mais nada a ninguém!
Um dia perguntou:
– Por que não podemos dizer que aquela Senhora nos disse
para fazermos sacrifícios pelos pecadores?
– Para que não nos perguntem que sacrifícios fazemos.
Minha mãe afligia-se cada vez mais com o progresso dos acontecimentos. Empregou, por isso, mais um esforço para me obrigar
a confessar que tinha mentido. Um dia, pela manhã, chama-me e
diz que me vai levar a casa do Senhor Prior:
(12) O primeiro interrogatório do Pároco, Pe. Manuel M. Ferreira, foi feito em fins
de Maio de 1917.
– Quando lá chegares, pões-te de joelhos, dizes-lhe que mentiste e pedes-lhe perdão.
Ao passar por casa de minha tia, minha mãe entrou uns minutos. Aproveitei a ocasião para contar à Jacinta o que se passava.
Ao ver-me aflita, deixou cair algumas lágrimas e disse-me:
– Vou-me já levantar e vou chamar o Francisco. Vamos para o
teu poço rezar. Quando voltares, vai lá ter.
À volta, corri ao poço e lá estavam os dois, de joelhos, a rezar.
Logo que me viram, a Jacinta correu a abraçar(-me) e a perguntar
como tinha feito. Contei-lhes. Depois, disse-me:
– Vês?! Não devemos ter medo de nada! Aquela Senhora ajuda-nos sempre. É tão nossa amiga!
Desde que Nossa Senhora nos ensinou a oferecer a Jesus os
nossos sacrifícios, sempre que combinávamos fazer algum ou que
tínhamos alguma prova a sofrer, a Jacinta perguntava:
– Já disseste a Jesus que é por Seu amor?
Se Ihe dizia que não...
– Então digo-Lho eu.
E punha as mãozinhas, levantava os olhos ao Céu e dizia:
– Ó Jesus, é por Vosso amor e pela conversão dos pecadores.
Entretanto, a notícia do acontecimento tinha-se espalhado.
Minha mãe começava a afligir-se e queria, a todo o custo, que eu
me desdissesse. Um dia, antes que saísse com o rebanho, quis
obrigar-me a confessar que tinha mentido. Não poupou, para isso,
carinhos, ameaças, nem mesmo o cabo da vassoura. Não conseguindo obter outra resposta que um mudo silêncio ou a
confirmação do que já tinha dito, mandou-me abrir o rebanho,
dizendo que pensasse bem, durante o dia; que, se nunca tinha
consentido uma mentira nos seus filhos, muito menos consentia
agora uma daquela espécie; que, à noite, me obrigaria a ir junto
daquelas pessoas a quem tinha enganado, confessar que tinha
mentido e pedir perdão.
Lá fui com as minhas ovelhinhas; e nesse dia já os meus
companheiros me esperavam. Ao verem-me a chorar, correram a
perguntar-me a causa. Contei-lhes o que se tinha passado e
acrescentei:
– Agora, digam-me como vou fazer?! Minha mãe quer, a todo
o custo, que diga que menti; e como vou a dizê-lo?
Então o Francisco diz para a Jacinta:
– Vês? Tu é que tens a culpa! Para que o foste a dizer?
A pobre criança, chorando, põe-se de joelhos, com as mãos
postas, a pedir-nos perdão:
– Fiz mal – dizia, chorando – mas eu nunca mais digo nada a
ninguém!
Agora, perguntará V. Ex.cia: Quem Ihe ensinou a fazer esse
acto de humildade?!
– Não sei. Talvez por ver seus irmãozinhos pedir perdão a
seus pais, na véspera de comungar; ou porque a Jacinta foi, segundo me parece, aquela a quem a Santíssima Virgem comunicou
maior abundância de graça, conhecimento de Deus e da virtude.
Quando, algum tempo depois, o Senhor Prior (12) nos mandou chamar, para nos interrogar, a Jacinta baixou a cabeça e a
custo sua Rev.cia conseguiu obter dela apenas duas ou três palavras. Quando viemos embora, perguntei-lhe:
– Por que não querias responder ao Senhor Prior?
– Porque prometi não dizer mais nada a ninguém!
Um dia perguntou:
– Por que não podemos dizer que aquela Senhora nos disse
para fazermos sacrifícios pelos pecadores?
– Para que não nos perguntem que sacrifícios fazemos.
Minha mãe afligia-se cada vez mais com o progresso dos acontecimentos. Empregou, por isso, mais um esforço para me obrigar
a confessar que tinha mentido. Um dia, pela manhã, chama-me e
diz que me vai levar a casa do Senhor Prior:
 
– Quando lá chegares, pões-te de joelhos, dizes-lhe que mentiste e pedes-lhe perdão.
Ao passar por casa de minha tia, minha mãe entrou uns minutos. Aproveitei a ocasião para contar à Jacinta o que se passava.
Ao ver-me aflita, deixou cair algumas lágrimas e disse-me:
– Vou-me já levantar e vou chamar o Francisco. Vamos para o
teu poço rezar. Quando voltares, vai lá ter.
À volta, corri ao poço e lá estavam os dois, de joelhos, a rezar.
Logo que me viram, a Jacinta correu a abraçar(-me) e a perguntar
como tinha feito. Contei-lhes. Depois, disse-me:
– Vês?! Não devemos ter medo de nada! Aquela Senhora ajuda-nos sempre. É tão nossa amiga!
Desde que Nossa Senhora nos ensinou a oferecer a Jesus os
nossos sacrifícios, sempre que combinávamos fazer algum ou que
tínhamos alguma prova a sofrer, a Jacinta perguntava:
– Já disseste a Jesus que é por Seu amor?
Se Ihe dizia que não...
– Então digo-Lho eu.
E punha as mãozinhas, levantava os olhos ao Céu e dizia:
– Ó Jesus, é por Vosso amor e pela conversão dos pecadores.
 
(12) O primeiro interrogatório do Pároco, Pe. Manuel M. Ferreira, foi feito em fins
de Maio de 1917.