Nos bailes, punham-me em cima duma arca ou duma outra
coisa alta, para não ser pisada pelos assistentes e onde devia entoar vários cantos ao som da guitarra ou do harmónio. Para isto,
minhas irmãs ensaiavam-me, assim como para bailar algumas valsas, quando faltasse algum par, o que eu desempenhava com uma
destreza única, atraindo assim as atenções e os aplausos dos assistentes. Nem me faltavam prémios e dádivas de alguns que queriam dar gosto a minhas irmãs.
Aos domingos, pela tarde, toda esta mocidade se juntava no
nosso pátio: no verão, à sombra de três grandes figueiras e no
inverno numa alpendurada que tínhamos no sítio onde está agora
a casa de minha irmã Maria, para aí passarem a tarde, jogando e
conversando com minhas irmãs.
Na Páscoa, era aí que se fazia a rifa das amêndoas, calhando-me a maior parte das rifas, porque alguns assim o faziam de
propósito, para se tornarem agradáveis. Minha mãe passava estas
tardes sentada à porta da cozinha que dava para o pátio, donde
podia ver o que se passava: umas vezes com um livro na mão,
lendo; outras, falando com alguma das minhas tias ou vizinhas que
viviam junto dela. Conservava sempre a sua seriedade habitual e
todos sabiam que o que ela dissesse era como uma escritura e
que era preciso obedecer-lhe sem demora. Nunca vi que diante
dela se atravesse alguém a dizer alguma palavra menos respeitosa ou com menos consideração. Era dito ordinário, entre aquela
gente, que minha mãe valia mais que todas as filhas. Lembro-me
de ouvir dizer várias vezes a minha mãe: Não sei que gosto esta
gente possa ter em andar falando pelas casas dos outros; para
mim, não há nada que chegue a uma leitura sossegadinha em mi-
nha casa. Estes livros trazem coisas tão bonitas! E as vidas dos
santos, que beleza!
Parece-me que já disse a V. Ex.cia Rev.ma como passava os
dias da semana rodeada das crianças do nosso lugar, que as mães,
para ir para os campos, pediam à minha para as deixar junto de
mim. Também me parece que, no escrito que enviei a V. Ex.cia Rev.ma
sobre a minha prima, dizia quais as minhas brincadeiras e entretenimentos. Por agora, não me detenho com isso. Assim, embalada
em mimos e carícias, cheguei aos meus 6 anos. E, para dizer a
verdade, o mundo começava a sorrir-me e sobretudo a paixão pelo
baile ia lançando em meu pobre coração fundas raízes. E confesso que, se o nosso bom Deus não tem usado para comigo da Sua
misericórdia especial, por aí o demónio ter-me-ia perdido.
Se me não engano, também já disse a V. Ex.cia, no mesmo
escrito, como minha mãe tinha por costume ensinar a doutrina
aos seus filhinhos nas horas da sesta, durante o Verão; no Inverno, a nossa lição era à noite, ao serão, depois da ceia, na
lareira, enquanto assávamos e comíamos as castanhas e as
bolotas doces.
Nos bailes, punham-me em cima duma arca ou duma outra
coisa alta, para não ser pisada pelos assistentes e onde devia entoar vários cantos ao som da guitarra ou do harmónio. Para isto,
minhas irmãs ensaiavam-me, assim como para bailar algumas valsas, quando faltasse algum par, o que eu desempenhava com uma
destreza única, atraindo assim as atenções e os aplausos dos assistentes. Nem me faltavam prémios e dádivas de alguns que queriam dar gosto a minhas irmãs.
Aos domingos, pela tarde, toda esta mocidade se juntava no
nosso pátio: no verão, à sombra de três grandes figueiras e no
inverno numa alpendurada que tínhamos no sítio onde está agora
a casa de minha irmã Maria, para aí passarem a tarde, jogando e
conversando com minhas irmãs.
Na Páscoa, era aí que se fazia a rifa das amêndoas, calhando-me a maior parte das rifas, porque alguns assim o faziam de
propósito, para se tornarem agradáveis. Minha mãe passava estas
tardes sentada à porta da cozinha que dava para o pátio, donde
podia ver o que se passava: umas vezes com um livro na mão,
lendo; outras, falando com alguma das minhas tias ou vizinhas que
viviam junto dela. Conservava sempre a sua seriedade habitual e
todos sabiam que o que ela dissesse era como uma escritura e
que era preciso obedecer-lhe sem demora. Nunca vi que diante
dela se atravesse alguém a dizer alguma palavra menos respeitosa ou com menos consideração. Era dito ordinário, entre aquela
gente, que minha mãe valia mais que todas as filhas. Lembro-me
de ouvir dizer várias vezes a minha mãe: Não sei que gosto esta
gente possa ter em andar falando pelas casas dos outros; para
mim, não há nada que chegue a uma leitura sossegadinha em mi-
nha casa. Estes livros trazem coisas tão bonitas! E as vidas dos
santos, que beleza!
Parece-me que já disse a V. Ex.cia Rev.ma como passava os
dias da semana rodeada das crianças do nosso lugar, que as mães,
para ir para os campos, pediam à minha para as deixar junto de
mim. Também me parece que, no escrito que enviei a V. Ex.cia Rev.ma
sobre a minha prima, dizia quais as minhas brincadeiras e entretenimentos. Por agora, não me detenho com isso. Assim, embalada
em mimos e carícias, cheguei aos meus 6 anos. E, para dizer a
verdade, o mundo começava a sorrir-me e sobretudo a paixão pelo
baile ia lançando em meu pobre coração fundas raízes. E confesso que, se o nosso bom Deus não tem usado para comigo da Sua
misericórdia especial, por aí o demónio ter-me-ia perdido.
Se me não engano, também já disse a V. Ex.cia, no mesmo
escrito, como minha mãe tinha por costume ensinar a doutrina
aos seus filhinhos nas horas da sesta, durante o Verão; no Inverno, a nossa lição era à noite, ao serão, depois da ceia, na
lareira, enquanto assávamos e comíamos as castanhas e as
bolotas doces.