49 A Igreja, comunidade daqueles que são convocados pelo Cristo Ressuscitado e se põem no seu seguimento, é o «sinal e a salvaguarda da dignidade da pessoa humana» [54] . Ela « é em Cristo como que sacramento ou sinal, e também instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano» [55] . A missão da Igreja é a de anunciar e comunicar a salvação realizada em Jesus Cristo, que Ele chama « Reino de Deus » (Mc 1, 15), ou seja, a comunhão com Deus e entre os homens. O fim da salvação, o Reino de Deus, abraça todos os homens e se realizará plenamente além da história, em Deus. A Igreja recebeu «a missão de anunciar e estabelecer em todas as gentes o Reino de Cristo e de Deus, e constitui ela própria na terra o germe e o início deste Reino» [56] .
50 A Igreja põe-se concretamente ao serviço do Reino de Deus, antes de mais nada, anunciando e comunicando o Evangelho da salvação e constituindo novas comunidades cristãs. Ela, ademais, «serve o Reino, difundindo pelo mundo os “valores evangélicos”, que são a expressão do Reino, e ajudam os homens a acolher o desígnio de Deus. É verdade que a realidade incipiente do Reino se pode encontrar também fora dos confins da Igreja, em toda a humanidade na medida em que ela viva os “valores evangélicos” e se abra à ação do Espírito que sopra onde e como quer (cf. Jo 3, 8); mas é preciso acrescentar, logo a seguir, que esta dimensão temporal do Reino está incompleta, enquanto não se ordenar ao Reino de Cristo, presente na Igreja, em constante tensão para a plenitude escatológica » [57] . Donde deriva, em particular, que a Igreja não se confunde com a comunidade política e nem está ligada a nenhum sistema político [58] . A comunidade política e a Igreja, no próprio campo, são efetivamente independentes e autônomas uma em relação à outra, e estão ambas, embora a diferentes títulos, «ao serviço da vocação pessoal e social dos mesmos homens » [59] . Pode-se, antes, afirmar que a distinção entre religião e política e o princípio da liberdade religiosa constituem uma aquisição específica do cristianismo, de grande relevo no plano histórico e cultural.
51 À identidade e à missão da Igreja no mundo, segundo o projeto de Deus realizado em Cristo, corresponde «uma finalidade salvífica e escatológica, que só pode ser plenamente alcançada no século futuro» [60] . Justo por isso, a Igreja oferece um contributo original e insubstituível à comunidade humana com a solicitude que a impele a tornar mais humana a família dos homens e a sua história, e a pôr-se como baluarte contra qualquer tentação totalitarista, indicando ao homem a sua vocação integral e definitiva [61] .
Com a pregação do Evangelho, a graça dos sacramentos e a experiência da comunhão fraterna, a Igreja sana e eleva a dignidade da pessoa humana, «firmando a coesão da sociedade e dando à atividade diária dos homens um sentido e um significado mais profundos» [62] . No plano das dinâmicas históricas concretas, não se pode compreender o advento do Reino de Deus na perspectiva de uma organização social, econômica e política definida e definitiva. Ele é antes testemunhado pelo progresso de uma sociabilidade humana que é para os homens fermento de realização integral, de justiça e de solidariedade, na abertura ao Transcendente como termo referencial para a própria definitiva e plena realização pessoal.