Vamos supor uma pessoa que peça o batismo, declarando que não renunciará ao culto dos ídolos, a não ser talvez mais tarde, quando ela achar melhor. Em seguida, com esta disposição, ela solicita a concessão imediata do batismo e aspira se tornar o templo do Deus vivo, apesar de sua idolatria e sua resolução em perseverar nesse abominável sacrilégio.
Eu pergunto aos meus adversários se eles consentiriam em receber como catecúmeno uma pessoa assim.
Eles vão dizer — eu não tenho dúvida — que é impossível receber uma pessoa assim. Seu coração não pode inspirar outra coisa. Que eles expliquem então, de acordo com testemunhos das Escrituras capazes de lhes autorizar sua opinião, baseado em que eles ousam combater e recusar o pedido de uma pessoa que protesta contra eles dizendo:
“Eu conheço e adoro o Jesus Crucificado. Eu creio que Jesus Cristo é o Filho de Deus. Não me façam esperar mais. Não me peçam mais nada”.
“O Apóstolo só impôs uma condição àqueles que ele regeneraria pelo Evangelho: reconhecer Jesus crucificado. O eunuco, diante da simples resposta de que ele acreditava que Jesus era o Filho de Deus, recebeu sem mais delongas o batismo das mãos de Felipe. Por que então me interditar o culto aos ídolos, invés de me marcar com o sinal de Jesus Cristo, antes que eu deixe este mundo?
“Quanto ao paganismo, eu o suguei com o leite e me mantive nele pela força do hábito. Eu o abandonarei quando puder, quando for minha hora e, mesmo que eu não o faça, eu poderei pelo menos terminar meus dias marcado com o sinal de Jesus Cristo e Deus não precisará pedir a vocês conta de minha alma”.
Que responder a este discurso? Consentirão em admitir esse pagão? Deus me livre de pensar que eles possam chegar a este extremo! O que eles poderiam responder? Sobretudo se o pagão pede para que não lhe peçam para renunciar à idolatria, da mesma forma como não se ensinou nada ao povo primitivo antes da passagem pelo Mar Vermelho, por que todas essas verdades estavam incluídas na Lei, que foi recebida fora do Egito, após sua libertação.
Sem dúvida que eles vão responder a esse homem:
“Você se tornará o templo de Deus após ter recebido o batismo. Ora, o Apóstolo diz: Como conciliar o templo de Deus e os ídolos?” (2Cor 6,16)
Por que eles não pensam que se pode dizer também:
“Você se tornará membro de Jesus Cristo, após ter recebido o batismo. Ora, os membros de Jesus Cristo não podem ser os de uma prostituta”.
Este também é o argumento do Apóstolo e ele diz, em outro lugar:
“Acaso não sabeis que os injustos não hão de possuir o Reino de Deus?”
Não vos enganeis: nem os impuros, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os devassos, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os difamadores, nem os assaltantes hão de possuir o Reino de Deus (1Cor 6,9-10).
Por que então recusar o batismo aos idólatras e acreditar que se pode admitir os fornicadores, quando o Apóstolo declara aos adúlteros e aos outros pecadores:
“Ao menos alguns de vós têm sido isso. Mas fostes lavados, mas fostes santificados, mas fostes justificados, em nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito de nosso Deus” (1Cor 6,11).
Por qual motivo, quando se pode rejeitar o adúltero e o idólatra, permitir ao primeiro se apresentar ao batismo sem que ele renuncie ao seu relacionamento criminoso e defender o segundo, já que se diz, tanto a um como ao outro:
“Vocês têm sido isso, mas foram purificados”?
O que preocupa nossos adversários é o pensamento de que se salvará infalivelmente, embora passando pelo fogo, se se acreditar em Jesus Cristo e se se foi marcado com seu sinal. Em outros termos, se se foi batizado, levou-se a indiferença a reformar os costumes que levam a viver no pecado. Mas eu logo vou examinar, com a ajuda de Deus, o que é preciso pensar sobre este ponto, de acordo com as Escrituras.