E quanto ao servidor do Evangelho que se recusou a aplicar o talento de seu senhor! Ele deveria banir toda preocupação e não temer ser acusado de negligência. Comparam-no com aqueles que não querem receber o talento que o Senhor lhes confia. Essa parábola (Mt 25,14-30) se dirige àqueles que não querem assumir na Igreja a função de distribuir os tesouros do Senhor, disfarçando sua indiferença sob o pretexto de que não querem responder pelos pecados alheios. Eles ouvem sem agir e recebem sem nada retribuir.
Ora, quando o servidor correto e fiel, cheio de entusiasmo por aplicar os tesouros de seu senhor e atento em administrar seus interesses, vem dizer a um adúltero:
“Se você quer ser batizado, deixe de ser adúltero; acredite em Jesus Cristo, que qualifica de adultério o relacionamento que você mantém. Deixe de pertencer a uma prostituta, se você quer se tornar membro de Jesus Cristo”.
Se esse homem lhe responde:
“Não obedecerei. Não pararei”.
Está claro que ele se recusa em receber o talento de boa qualidade do Senhor, ou então que ele gostaria de misturar a esse tesouro sua falsidade.
Suponhamos que, após ter prometido obedecer, ele não cumpre seu compromisso e não se possa corrigi-lo. É preciso ver o que fazer com ele, para impedi-lo de arruinar outros, após ele ter arruinado a ele mesmo. Peixe ruim, perdido na rede divina, deve ser impedido de prender em suas armadilhas os peixes do Senhor. Que não se permita que, levando uma vida culposa na Igreja, ele faça nascer uma doutrina perniciosa.
Se esses pescadores — fazendo a apologia de suas torpezas e espalhando a intenção expressa de perseverar nelas — são admitidos ao batismo, então só nos resta, me parece, pregar que os fornicadores e os adúlteros, que devem guardar seus hábitos criminosos até o fim de seus dias, possuirão o reino de Deus e, por causa da fé, totalmente morta que é sem as obras, obterão a vida e a salvação eterna.
Esta é a mais perigosa das redes e os pescadores devem desconfiar dela. Eu falo assim pensando que a parábola do Evangelho designa os bispos e os diretores subalternos da Igreja, segundo estas palavras: Vinde após mim e vos farei pescadores de homens (Mt 4,19). A rede prende todo tipo de peixes, bons e maus; mas uma má rede jamais prenderá os bons peixes. Ora, no seio da verdadeira doutrina pode-se ser bom se se acrescenta as obras à fé; mau, se se acredita sem praticar. Na heresia, se é mau não se conformando ao que se acredita ser verdadeiro; mas culpado também, se se conforma a isso.