IV. UMA RESPONSABILIDADE COMUM

IV. UMA RESPONSABILIDADE COMUM

a) O ambiente, um bem coletivo

466 A tutela do ambiente constitui um desafio para toda a humanidade: trata-se do dever, comum e universal, de respeitar um bem coletivo [979] , destinado a todos, impedindo que se possa fazer «impunemente uso das diversas categorias de seres, vivos ou inanimados — animais, plantas e elementos naturais — como se quiser, em função das próprias exigências» [980] . É uma responsabilidade que deve amadurecer com base na globalidade da presente crise ecológica e à conseqüente necessidade de enfrentá-la globalmente, enquanto todos os seres dependem uns dos outros na ordem universal estabelecida pelo Criador: «é preciso ter em conta a natureza de cada ser e as ligações mútuas entre todos, num sistema ordenado, qual é exatamente o cosmos» [981] .

Esta perspectiva reveste uma particular importância quando se considera, no contexto dos estreitos liames que unem vários ecossistemas entre si, o valor da biodiversidade, que deve ser tratada com sentido de responsabilidade e adequadamente protegida, porque constitui uma extraordinária riqueza para a humanidade toda. A tal propósito, cada um pode facilmente advertir, por exemplo, a importância da região amazônica, «um dos espaços mais apreciados do mundo pela sua diversidade biológica, que o torna vital para o equilíbrio ambiental de todo o planeta» [982] As florestas contribuem para manter equilíbrios naturais essenciais indispensáveis para a vida [983] . A sua destruição, também através de inconsiderados incêndios dolosos acelera o os processos de desertificação com perigosas conseqüências para as reservas de água e compromete a vida de muitos povos indígenas e o bem-estar das gerações futuras. Todos, indivíduos e sujeitos institucionais, devem sentir-se comprometidos a proteger o patrimônio florestal e, onde necessário, promover adeguados programas de reflorestamento.

467 A responsabilidade em relação o ao ambiente, patrimônio comum do gênero humano, se estende não apenas às exigências do presente, mas também às do futuro: «Herdeiros das gerações passadas e beneficiários do trabalho dos nossos contemporâneos, temos obrigações para com todos, e não podemos desinteressar-nos dos que virão depois de nós aumentar o círculo da família humana. A solidariedade universal é para nós não só um fato e um beneficio, mas também um dever» [984] Trata-se de uma responsabilidade que as gerações presentes têm em relação às futuras [985] , uma responsabilidade que pertence também a cada um dos Estados e à Comunidade Internacional.

468 A responsabilidade em relação ao ambiente deve encontrar uma tradução adequada em campo jurídico. É importante que a Comunidade Internacional elabore regras uniformes para que tal regulamentação consinta aos Estados controlar com maior eficácia as várias atividades que determinam efeitos negativos no ambiente e preservar os ecossistemas prevendo possíveis acidentes: «Compete a cada Estado, no âmbito do próprio território, a tarefa de prevenir a degradação da atmosfera e da biosfera, exercendo um controlo atento, além do mais, sobre os efeitos das novas descobertas tecnológicas e científicas; e ainda, dando aos próprios cidadãos a garantia de não estarem expostos a agentes inquinantes e a emanações tóxicas» [986] .

O conteúdo jurídico do «direito a um ambiente são e seguro» [987] é fruto de uma elaboração gradual, requerida pela preocupação da opinião pública em disciplinar o uso dos bens da criação segundo as exigências do bem comum e em uma vontade comum de introduzir sanções para aqueles que poluem. As normas jurídicas, todavia, por si sós não bastam [988] ; a par destas, devem amadurecer um forte senso de responsabilidade, bem como uma efetiva mudança nas mentalidades e nos estilos de vida.

469 As autoridades chamadas a tomar decisões para afrontar riscos sanitários e ambientais, às vezes, se encontram diante de situações nas quais os dados científicos disponíveis são contraditórios ou quantitativamente escassos: em tal caso pode ser oportuna uma avaliação inspirada pelo «princípio de precaução», que não comporta a aplicação de uma regra, mas uma orientação ordenada a administrar situações de incerteza. Esta manifesta a exigência de uma decisão provisória e modificável com base em novos conhecimentos que eventualmente se venham a alcançar. A decisão deve ser proporcional às providências já tomadas em vista de outros riscos. As políticas cautelatórias, baseadas no princípio de precaução, requerem que as decisões sejam baseadas em um confronto entre riscos e benefícios previsíveis para cada possível opção alternativa, inclusive a decisão de não atuar. À abordagem baseada no princípio de precaução liga-se a exigência de promover todo o esforço para adquirir conhecimentos mais aprofundados, mesmo sabendo que a ciência não pode chegar rapidamente a conclusões acerca da ausência de riscos. As circunstâncias de incerteza e a provisoriedade tornam particularmente importante a transparência no processo decisório.

470 A programação do desenvolvimento econômico deve considerar atentamente a «necessidade de respeitar a integridade e os ritmos da natureza» [989] , já que os recursos naturais são limitados e alguns não são renováveis. O atual ritmo de exploração compromete seriamente a disponibilidade de alguns recursos naturais para o tempo presente e para o futuro [990] . A solução do problema ecológico exige que a atividade econômica respeite mais o ambiente, conciliando as exigências do desenvolvimento econômico com as da proteção ambiental. Toda atividade econômica que se valer dos recursos naturais deve também preocupar-se com a salvaguarda do ambiente e prever-lhe os custos, que devem ser considerados como «um item essencial dos custos da atividade econômica» [991] . Neste contexto hão de ser consideradas as relações entre a atividade humana e as mudanças climáticas que, vista a sua complexidade, devem ser oportuna e constantemente em nível científico, político e jurídico, nacional e internacional. O clima é um bem a ser protegido e exige que, no seu comportamento, os consumidores e os que exercem atividade industrial desenvolvam um maior senso de responsabilidade [992] .

Uma economia respeitosa do ambiente não perseguirá unicamente o objetivo da maximização do lucro, porque a proteção ambiental não pode ser assegurada somente com base no cálculo financeiro de custos e benefícios. O ambiente é um dos bens que os mecanismos de mercado não são aptos a defender ou a promover adequadamente [993] . Todos os países, sobretudo os desenvolvidos, devem perceber como urgente a obrigação de reconsiderar as modalidades do uso dos bens naturais. A busca de inovações capazes de reduzir o impacto sobre o ambiente provocado pela produção e pelo consumo deve ser eficazmente incentivada.

Uma atenção particular deverá ser reservada às complexas problemáticas concernentes aos recursos energéticos [994] . As não renováveis, exploradas pelos países altamente industrializados e por aqueles que de recente industrialização, devem ser postas ao serviço de toda a humanidade. Em uma perspectiva moral caracterizada pela eqüidade e pela solidariedade entre as gerações, se deverá, outrossim, continuamente, mediante o contributo da comunidade científica, a identificar novas fontes energéticas, a desenvolver as alternativas e a elevar o nível de segurança da energia nuclear [995] . A utilização da energia, pela conexão que tem com as questões do desenvolvimento e do ambiente, chama em causa a responsabilidade política dos estados, da comunidade internacional e dos operadores econômicos; tais responsabilidades deverão ser iluminadas e guiadas pela busca contínua do bem comum universal.

 

471 Uma atenção especial merece a relação que os povos indígenas mantêm com a sua terra e os seus recursos: trata-se de uma expressão fundamental da sua identidade [996] .Muitos povos já perderam ou correm o risco de perder, em vantagem de potentes interesses agro-industriais ou em força dos processos de assimilação e de urbanização, as terras em que vivem [997] , as quais está vinculado o próprio sentido de suas existências [998] . Os direitos dos povos indígenas devem ser oportunamente tutelados [999] . Estes povos oferecem um exemplo de vida em harmonia com o ambiente que eles aprenderam a conhecer e preservar [1000] : a sua extraordinária experiência, que é uma riqueza insubstituível para toda a humanidade, corre o risco de se perder juntamente com o ambiente do qual se origina.

 

b) O uso das biotecnologias

 

472 Nos últimos anos, se impôs com força a questão do uso das novas biotecnologias para fins ligados à agricultura, à zootecnia, à medicina e à proteção do ambiente. As novas possibilidades oferecidas pelas atuais técnicas biológicas e biogenéticas suscitam, de um lado, esperanças e entusiasmos e, de outro lado, alarme e hostilidade. As aplicações das biotecnologias, a sua liceidade do ponto de vista moral, as suas conseqüências para a saúde do homem, o seu impacto sobre o ambiente e sobre a economia, constituem objeto de estudo aprofundado e de vívido debate. Trata-se de questões controversas que envolvem cientistas e pesquisadores, políticos e legisladores, economistas e ambientalistas, produtores e consumidores. Os cristãos não ficam indiferentes a estas problemáticas, cônscios da importância dos valores em jogo [1001] .

 

473. A visão cristã da criação comporta um juízo positivo sobre a liceidade das intervenções do homem na natureza, inclusive os outros seres vivos, e, ao mesmo tempo, uma forte chamada ao senso de responsabilidade [1002] . De fato, a natureza não é uma realidade sacra ou divina, subtraída à ação humana. É, antes, um dom oferecido pelo Criador à comunidade humana, confiado à inteligência e à responsabilidade moral do homem. Por isso ele não comete um ato ilícito quando, respeitando a ordem, a beleza e a utilidade de cada ser vivente e da sua função no ecossistema, intervém modificando-lhe algumas características e propriedades. São deploráveis as intervenções do homem quando danificam os seres viventes ou o ambiente natural, ao passo que são louváveis quando se traduzem no seu melhoramento. A liceidade do uso das técnicas biológicas e biogenéticas não esgotam toda a problemática ética: como no que concerne qualquer comportamento humano, é necessário avaliar cuidadosamente a sua real utilidade, bem como as possíveis conseqüências também em termos de riscos. No âmbito das intervenções técnico-científicas de forte e ampla incidência sobre os organismos viventes, com a possibilidade de notáveis repercussões a longo prazo, não é lícito agir com ligeireza e irresponsabilidade.

 

474 As modernas biotecnologias têm um forte impacto social, econômico e político, no plano local, nacional e internacional: hão de ser avaliadas de acordo com os critérios éticos que devem sempre orientar as atividades e as relações humanas no âmbito sócio-econômico e político [1003] . É necessário ter na devida conta sobretudo os critérios de justiça e solidariedade, aos quais se devem ater antes de tudo os indivíduos e os grupos que atuam na pesquisa e comercialização no campo das biotecnologias. Todavia, não se deve cair no erro de crer que a mera difusão dos benefícios ligados às novas tecnologias possa resolver todos os urgentes problemas de pobreza e de subdesenvolvimento que ainda insidiam tantos países do planeta.

 

475 Em um espírito de solidariedade internacional, várias medidas podem ser atuadas em relação ao uso de novas biotecnologias. Deve ser facilitado, em primeiro lugar, o intercâmbio comercial eqüitativo, livre de vínculos injustos. A promoção do desenvolvimento dos povos mais desfavorecidos não será porém autêntica e eficaz se se reduz ao intercâmbio de produtos. É indispensável favorecer também a maturação de uma necessária autonomia científica e tecnológica por parte daqueles mesmos povos, promovendo também os intercâmbios de conhecimentos científicos e as tecnologias bem como a transferência de tecnologias para os países em via de desenvolvimento.

476 A solidariedade comporta também uma chamada à responsabilidade que têm os países em via de desenvolvimento e em particular, os seus responsáveis políticos, em promover uma política comercial favorável aos seus povos e o intercâmbio de tecnologias capazes de melhorar as condições alimentares e sanitárias. Em tais países deve crescer o investimento na pesquisa, com especial atenção às características e às necessidades particulares do próprio território e da própria população, sobretudo levando em conta que algumas pesquisas no campo das biotecnologias, potencialmente benéficas, requerem investimentos relativamente modestos. Para este fim seria útil a criação de Organismos nacionais dedicados à proteção do bem comum mediante uma atenta gestão dos riscos.

 

477 Os cientistas e técnicos empenhados no setor das biotecnologias são chamados a trabalhar com inteligência e perseverança na busca de melhores soluções para os graves e urgentes problemas da alimentação e da saúde. Eles não se devem esquecer de que as suas atividades dizem respeito a materiais, viventes e não, pertencentes à humanidade como um patrimônio, destinado também às gerações futuras; para os crentes se trata de um dom recebido do Criador, confiado à inteligência e à liberdade humanas, também estas dons do Altíssimo. Saibam os cientistas empenhar as suas energias e as suas capacidades em uma busca apaixonada, guiada por uma consciência límpida e honesta [1004] .

 

478 Os empresários e responsáveis pelas entidades públicas que se ocupam da pesquisa, da produção e do comércio dos produtos derivados das novas biotecnologias devem ter em conta não só o legítimo lucro, mas também o bem comum. Este princípio, válido para todo tipo de atividade econômica, torna-se particularmente importante quando se trata de atividades que se relacionam com a alimentação, a medicina, a proteção da saúde e do ambiente. Com as suas decisões, empresários e responsáveis pelas entidades públicas interessadas podem orientar os progressos no setor das biotecnologias para metas muito promissoras pelo que respeita a luta contra a fome, especialmente nos países mais pobres, a luta contra as doenças e a luta pela salvaguarda do ecossistema, patrimônio de todos.

 

479 Os políticos, os legisladores e os administradores públicos têm a responsabilidade de avaliar as potencialidades, as vantagens e os eventuais riscos conexos com o uso das biotecnologias. Não é de desejar que as suas decisões, em plano nacional ou internacional, sejam ditadas por pressões provenientes de interesses de parte. As autoridades públicas devem favorecer também uma correta informação da opinião pública e saber, em todo caso, tomar as decisões convenientes para o bem comum.

 

480 Também os responsáveis pela informação têm uma tarefa importante, a desempenhar com prudência e objetividade. A sociedade espera da parte deles uma informação completa e objetiva, que ajude os cidadãos a formar uma opinião correta acerca dos produtos biotecnológicos, sobretudo porque se trata de algo que lhes diz respeito diretamente enquanto possíveis consumidores. Deve-se, portanto, evitar cair na tentação de uma informação superficial, alimentada por entusiasmos fáceis ou por alarmismos injustificados.

c) Ambiente e partilha dos bens

481 Também no campo da ecologia a doutrina social convida a ter presente que os bens da terra foram criados por Deus para ser sabiamente usados por todos: tais bens devem ser divididos com equidade, segundo a justiça e a caridade. Trata-se essencialmente de impedir a injustiça de um açambarcamento dos recursos: a avidez, seja esta individual ou coletiva, é contrária à ordem da criação [1005] .Os atuais problemas ecológicos, de caráter planetário, podem ser eficazmente enfrentados somente através de uma cooperação internacional capaz de garantir uma maior coordenação do uso dos recursos da terra.

482 O princípio da destinação universal dos bens oferece uma fundamental orientação, moral e cultural, para desatar o complexo e dramático nó que liga crises ambientais e pobreza. A atual crise ambiental atinge particularmente os mais pobres, seja porque vivem naquelas terras sujeitas à erosão e à desertificação, ou porque envolvidos em conflitos armados ou ainda constrangidos a migrações forçadas, seja porque não dispõem dos meios econômicos e tecnológicos para proteger-se das calamidades.

Muitíssimos destes pobres vivem nos subúrbios poluídos das cidades em alojamentos casuais ou em aglomerados de casas decadentes e perigosas. (slums, bidonvilles, Barrios, favelas).

Ademais, tenha-se sempre presente, a situação dos países penalizados pelas regras de comércio internacional não eqüitativo, nos quais prevalece uma escassez de capitais freqüentemente agravada pelo ônus da dívida externa: nestes casos a fome e a pobreza tornam quase inevitável uma exploração intensiva e excessiva do ambiente.

 

483 O estreito liame que existe entre desenvolvimento dos países mais pobres, crescimento demográfico e uso razoável do ambiente, não é utilizado como pretexto para escolas políticas e econômicas pouco conformes à dignidade da pessoa humana. No Norte do planeta se assiste a uma «a quebra do índice de natalidade, com repercussões sobre o envelhecimento da população, que se torna incapaz mesmo de se renovar biologicamente» [1006] , ao passo que no Sul a situação é diferente. Se é verdade que a desigual distribuição da população e dos recursos disponíveis cria obstáculos ao desenvolvimento e ao uso sustentável do ambiente, deve-se reconhecer que o crescimento demográfico é plenamente compatível com um desenvolvimento integral e solidário [1007] : «Existe uma opinião vastamente difundida, segundo a qual a política demográfica é apenas uma parte da estratégia global sobre o desenvolvimento. Por conseguinte, é importante que qualquer debate acerca de políticas demográficas tenha em consideração o desenvolvimento presente e futuro, tanto das nações como das regiões. Ao mesmo tempo, é impossível pôr de parte a natureza mesma daquilo que a palavra “desenvolvimento” significa. Qualquer desenvolvimento digno deste nome deve ser integral, ou seja, deve orientar-se para o verdadeiro bem de cada pessoa e de toda a pessoa» [1008] .

484 O princípio da destinação universal dos bens se aplica naturalmente também à água, considerada nas Sagradas Escrituras como símbolo de purificação (cf. Sal 51, 4, Jo 13, 8) e de vida (cf. Jo 3,5; Gal 3,27): «Como dom de Deus, a água é instrumento vital, imprescindível para a sobrevivência e, portanto, um direito de todos» [1009] . A utilização da água e dos serviços conexos deve ser orientada à satisfação das necessidades e sobretudo das pessoas que vivem em pobreza. Um acesso limitado à água potável incide no bem-estar de um número enorme de pessoas e é freqüentemente causa de doenças, sofrimentos, conflitos, pobreza e até mesmo de morte: para ser adequadamente resolvida, tal questão «necessita ... ser enquadrada de forma a estabelecer critérios morais baseados precisamente no valor da vida e no respeito pelos direitos e pela dignidade de todos os seres humanos» [1010] .

 

485. A água, pela sua própria natureza, não pode ser tratada como uma mera mercadoria entre outras e o seu uso deve ser racional e solidário. A sua distribuição se enumera, tradicionalmente entre as responsabilidades dos órgãos públicos, porque a água sempre foi considerada como um bem público, característica que deve ser mantida caso a gestão venha a ser confiada ao setor privado. O direito à água [1011] , como todos os direitos do homem, se baseia na dignidade humana, e não em considerações de tipo meramente quantitativo, que consideram a água tão somente como um bem econômico. Sem água a vida é ameaçada. Portanto, o direito à água é um direito universal e inalienável.

 

d) Novos estilos de vida

 

486 Os graves problemas ecológicos exigem uma efetiva mudança de mentalidade que induza a adotar novos estilos de vida [1012] , «nos quais a busca do verdadeiro, do belo e do bom, e a comunhão com os outros homens, em ordem ao crescimento comum, sejam os elementos que determinam as opções do consumo, da poupança e do investimento» [1013] . Tais estilos de vida devem ser inspirados na sobriedade, na temperança, na autodisciplina, no plano pessoal e social. É necessário sair da lógica do mero consumo e promover formas de produção agrícola e industrial que respeitem a ordem da criação e satisfaçam as necessidades primárias de todos. Uma semelhante atitude, favorecida por uma renovada consciência da interdependência que une todos os habitantes da terra, concorre para eliminar diversas causas de desastres ecológicos e garante uma tempestiva capacidade de resposta quando tais desastres atingem povos e territórios [1014] . A questão ecológica não deve ser abordada somente pelas aterrorizantes perspectivas que o degrado ambiental perfila: esta deve traduzir-se, sobretudo, em uma forte motivação para uma autêntica solidariedade de dimensão universal.

 

487 A atitude que deve caracterizar o homem perante a criação é essencialmente a da gratidão e do reconhecimento: de fato, o mundo nos reconduz ao mistério de Deus que o criou e o sustém. Se se coloca entre parentes a relação com Deus, esvazia-se a natureza do seu significado profundo, depauperando-a. Se, ao contrário, se chega a descobrir a natureza na sua dimensão de criatura, é possível estabelecer com ela uma relação comunicativa, colher o seu significado evocativo e simbólico, penetrar assim no horizonte do mistério, franqueando ao homem a abertura para Deus, Criador dos céus e da terra. O mundo se oferece ao olhar do homem como rastro de Deus, lugar no qual se desvela a Sua força criadora, providente e redentora.